Em meio à correria das ruas e estações de metrô de São Paulo, o técnico aposentado Geraldo Vaz Júnior, de 58 anos, chama atenção ao carregar um cartaz pedindo Justiça. Ele afirma ter sido vítima de negligência médica, após receber, em 2023, um fígado com câncer durante um transplante realizado em um hospital da capital paulista.
A denúncia foi feita por sua esposa, Márcia Helena Vaz, em entrevista ao portal LeoDias. O casal alega que, desde o procedimento, enfrenta uma luta por respostas de autoridades e instituições de saúde.
“Recebi, no ano de 2023, através do transplante de fígado, um órgão doente com câncer, confirmado através de exame de DNA realizado por um hospital de renome. Peço ao Ministério Público que nos ajude na investigação e que a Secretaria de Saúde esclareça o que ocorreu”, diz o texto do cartaz exibido por Geraldo.
Segundo Márcia, o casal procurou vereadores, deputados, o Ministério Público e a Secretaria de Saúde de São Paulo, mas, até o momento, não obteve retorno efetivo.
“Falamos três vezes com um deputado, fomos à Comissão de Saúde da Câmara dos Vereadores, mandamos e-mails para o secretário, fomos ao MP, que disse que não iria acolher o caso, e nos orientaram a procurar a defensoria pública”, relatou ela.
Exame genético comprovou que o câncer veio do doador
De acordo com laudo de genotipagem por STR (Short Tandem Repeat), o adenocarcinoma encontrado no fígado transplantado tem origem nas células do doador, e não do receptor.
O exame indica que o câncer é compatível com origem intestinal, possivelmente do intestino grosso, reto ou cólon.
“As células do tumor apresentavam genótipo diferente das células do sangue periférico do paciente, incluindo os cromossomos sexuais — XY no sangue periférico e XX nas células neoplásicas”, diz o laudo.
Ainda segundo o documento, o adenocarcinoma metastático pode ter sido transmitido durante o transplante, na forma de micrometástases ou células tumorais isoladas.
Além do câncer, paciente também contraiu vírus grave
Márcia também relatou que o mesmo fígado transplantado estava contaminado com citomegalovírus (CMV), o que agravou ainda mais o quadro clínico do marido.
“Meu marido nunca teve o vírus, mas logo após o transplante ele testou positivo e precisou iniciar tratamento antiviral, sem nem saber que já estava com câncer”, contou.
Retransplante e tratamento contra o câncer
Em 2024, Geraldo recebeu um novo fígado, desta vez saudável. No entanto, a doença já havia se espalhado e atingido o pulmão, exigindo tratamento oncológico contínuo.
Atualmente, ele segue em tratamento pelo SUS e realiza sessões de quimioterapia para controlar o câncer metastático. A esposa segue ao lado dele na luta por Justiça e transparência sobre o caso.
“Não sabemos onde aconteceu o erro, mas queremos respostas. Não buscamos culpados, queremos esclarecimentos”, disse Márcia.
Carta aberta e pedido de Justiça
Em uma carta aberta, Geraldo desabafa:
“Fui contaminado com câncer por um órgão transplantado. Pela legislação brasileira, órgãos com neoplasia metastática devem ser descartados. Mesmo assim, o transplante foi feito, sem que fôssemos informados de qualquer risco. Desde então, nossa vida virou um pesadelo.”
Ele relata ainda que sofreu rejeição do segundo transplante, vive com limitações físicas e depende integralmente dos cuidados da esposa.
O que dizem as autoridades
Em nota, a Secretaria de Saúde de São Paulo afirmou que as informações de saúde de pacientes são protegidas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e, por isso, não pode divulgar detalhes sobre o caso.
Já o Ministério da Saúde informou que todos os transplantes realizados no Brasil seguem protocolos rigorosos de segurança e eficácia, reconhecidos internacionalmente, e que não há evidências de que o câncer tenha relação direta com o órgão transplantado.